sexta-feira, novembro 19, 2010

Quando as fontes mentem (1)

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Na sua edição de ontem (18/11/2010) a revista SÁBADO, (edição em papel) em suplemento intitulado Os melhores hospitais doença a doença, publica, na página 17, o apontamento histórico que aqui reproduzimos. A intenção é louvável; o resultado é lamentável. O Prémio Nobel atribuído a Egas Moniz não se deveu à Angiografia Cerebral mas sim à Leucotomia Préfrontal. Gostaríamos de saber, apesar de tudo, quais terão sido as fontes utilizadas. Sempre poderíamos aprender mais qualquer coisa…

terça-feira, novembro 16, 2010

Como ganhar um Prémio Nobel: algumas sugestões


A edição online de La Recherche publica "Comment obtenir un prix Nobel", artigo interessante, da autoria de Mathieu Nowak, que fornece algumas sínteses estatísticas e outras particularidades do funcionamento da Fundação Nobel.

Num registo meio irónico, termina alertando para o perigo de contracção da nobelite, um tipo de doença que parece atacar alguns cientistas esperançosos. Depois de fornecer receitas para potenciais candidatos ao Prémio, previne-os contra o risco de contrairem a nobelite.

Francamente!

terça-feira, novembro 02, 2010

A 1ª República, os médicos, a saúde e o corpo




A não perder.

Versão virtual também [aqui].

O Catálogo contém bons artigos de Rita Garnel (Comissária da Exposição), "Corpo: Estado, medicina e sociedade no tempo da I República"; de João Lobo Antunes, sobre Egas Moniz, "Algum ilusório sucesso e muitas contrariedades"; de Maria Fátima Nunes, "As sociabilidades médico-científicas"; de Madalena Esperança Pina, "As faculdades de medicina na I República"; de João Rui Pita, "A farmácia na República"; de Alexandre Alegre, "Saúde, higiene e arquitectura escolar"; de Jorge Fernandes Alves, "Saúde e fraternidade"; de José Morgado Pereira, "A psiquiatria no tempo da I República"; e de Jorge Costa Santos, "Corpo desviante".

terça-feira, outubro 12, 2010

Prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia de 2010



Robert G. Edwards


O Prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia foi descerrado este ano a um dos “pais” da Fertilização in Vitro (IVF no acrónimo anglo-saxónico), Robert Geoffrey Edwards, pelo desenvolvimento do método (e suas aplicações clínicas). Imediatamente após o anúncio, o Professor Christer Höög, do Comité Nobel, deu uma curta entrevista (disponível no Site Oficial da Fundação Nobel) acerca de algumas das questões envolvidas.

Christer Höög salientou o carácter inédito do prémio deste ano. Segundo ele,  é a primeira vez que os residentes do Karolinska premeiam a reprodução medicamente assistida, fazendo-o, neste caso, mais de meio século depois da divulgação pública dos primeiros resultados obtidos em laboratório e 37 anos após o nascimento do primeiro "bebé proveta".

A manipulação de embriões suscitou, desde o início, questões religiosas e éticas. Há quem veja neste prémio "tardio" uma espécie de levantamento do embargo ético à manipulação de embriões humanos, coisa que Christer Höög rejeita na referida entrevista.

Há, porém, um outro aspecto muito interessante no discurso de Höög. Justificando a "demora" no reconhecimento da eficácia da Fertilização In Vitro, o porta-voz do Comité Nobel sublinha que os numerosos estudos de acompanhamento forneceram, ao longo dos últimos trinta anos,  uma base sólida para a fundamentação do veredicto. E nas entrelinhas deste último argumento, não pode deixar-se de detectar um sinal: o de que o Comité Nobel reconhece, implicitamente,  nem sempre ter tido desse cuidado...

segunda-feira, outubro 11, 2010

A Medicina na Azulejaria (*)






Um repositório da azulejaria (**) associado à história das doenças e das saúdes, navegando à vista a história da medicina. A autora (***) põe em relação as mitologias e as origens ocidentais dos saberes curativos, entretecidas de apontamentos breves sobre o modus faciendi de físicos, cirurgiões e barbeiros, através de um roteiro da azulejaria portuguesa que atravessa hospitais, igrejas, conventos e palácios, guiando o olhar do leitor com elementos da história das artes e das ciências da saúde.

Ao longo de 89 gravuras que reproduzem peças da azulejaria que contêm os tais traços que o título promete, a docente e investigadora da Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa, identifica os temas associados à sanidade por sábios, santos, deuses e médicos, discorrendo sobre arte, ciência, religião, ilustrando contextos com ditados, comentários,  fábulas e fechando com uma homenagem fulgurante a Abel Salazar que terá dito um dia que O médico que só sabe de medicina, nem de medicina sabe.

Um livro para todos.




(*) PINA, Madalena Esperança, Traços da Medicina na Azulejaria de Lisboa, Casal de Cambra, Caleidoscópio, 2010.

(**) Tal como reza a sinopse da WOOK, ” A Azulejaria é como se sabe uma arte muito própria de Portugal, que atingiu um destaque na cultura e na identidade do nosso país. Esta obra procura dar a conhecer de uma forma objectiva e realista as representações da azulejaria que se prendem com a temática da Medicina reforçando a sua vertente mais humanista. A autora relacionou ainda este contexto a outras áreas afins como a acção médica e patológica, a higiene e a assistência, os ciclos temáticos sobre os cinco sentidos e os quatro elementos, a iconografia religiosa e outros. A obra debruçou-se nos azulejos produzidos entre o século XVII e a década de 90 do século XX na área de Lisboa.”

(***) Madalena Esperança Pina é docente de História da Medicina na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa desde 2001, onde obteve o grau de Doutor. Licenciou-se em História, variante de História da Arte, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa . É também investigadora do CEHFCI – Centro de Estudos de História e Filosofia da Ciência.

quarta-feira, agosto 11, 2010

Mataram o Sidónio (4)

João Alberto Pereira de Azevedo NevesAntónio Caetano de Abreu Freire Egaz Moniz
Azevedo Neves e Egas Moniz


A proximidade e cumplicidade de Azevedo Neves e de Moreira Júnior com Egas Moniz, tal  como aflorei no anterior poste, vinham muito de trás. Da Câmara dos Deputados da Monarquia Constitucional, em que conviveram; do Partido Progressista, de que eram membros (Moniz viria a afastar-se apenas em 1905, acompanhando a chamada Dissidência Progressista liderada por José Maria d’Alpoim). Cruzaram-se, pois, na vida política, tanto quanto na vida Universitária, Médica, Associativa e Hospitalar, em vários momentos e fases.

Quando, em 1928, Egas Moniz é nomeado, pela 1ª vez, para o Prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia(*), Azevedo Neves encontra-se entre os nomeadores, enaltecendo a importância médico-científica da sua Encefalografia Arterial; e em 1937, por altura da 3ª nomeação de Egas Moniz para o mesmo prémio, as duas cartas que dão entrada no Instituto Karolinska, vão assinadas, respectivamente, por Azevedo Neves (de novo) e por Moreira Júnior, destacando, desta vez, quer a já  mencionada Encefalografia Arterial, quer a Leucotomia pré-frontal que tanta controvérsia viria a levantar.

Se confrontarmos a reacção de Egas Moniz, ficcionado por Moita Flores, ao excurso metafísico de Azevedo Neves acerca dos limites do “bisturi”, não podemos deixar de sorrir e lembrar que, se assim pensasse, Azevedo Neves não nomearia, em coerência, Egas Moniz para o Prémio Nobel de 1937.

Diz Azevedo Neves (ficcionado):

Considero que a nossa dimensão ontológica escapa ao bisturi do cirurgião e não é perceptível na bancada de autópsias. Abrimos cadáveres, jamais dissecaremos um espírito. A razão já não habita o corpo morto. Dissolve-se na morte? Emigra para o mundo dos espíritos? Encontra-se com os anjos que ladeiam São Pedro? Confesso que não sei.”(**)

Quais teriam sido, anos mais tarde, as reflexões de Azevedo Neves e de Moreira Júnior para apoiarem a Psicocirurgia?

Mistério.


(**) FLORES, Francisco Moita, Mataram o Sidónio!, Alfragide, Casa das Letras, 2010, p. 118.

terça-feira, agosto 10, 2010

Mataram o Sidónio (3)


O diálogo Azevedo Neves – Egas Moniz estabelece-se à saída do cemitério do Alto de S. João, após o funeral da mulher de Asdrúbal d’Aguiar, vítima da pneumónica. Asdrúbal ocupava então o cargo de Director interino do Instituto de Medicina Legal, na ausência de Azevedo Neves. Tinha sido, também, discípulo de Egas Moniz. À mesma hora, realizavam-se, a caminho do Panteão Nacional, as cerimónias fúnebres de Sidónio Pais. Egas Moniz estranha que Azevedo Neves, membro do Governo de Sidónio, não esteja lá a prestar-lhe as suas últimas homenagens.

A conversa afigura-se interessante e profunda, em redor dos limites do conhecimento científico, do espiritismo e da metafísica, mas há três aspectos que poderiam equivocar o leitor historicamente incauto.

1º) Egas Moniz era, tal como Azevedo Neves (a quem parece admoestar pela ausência das exéquias fúnebres de Sidónio), membro do mesmo Governo, sobraçando a Secretaria dos Negócios Estrangeiros. Era, portanto, no Governo de Sidónio, colega de Azevedo Neves. Qual o sentido da chamada de atenção de Egas Moniz a Azevedo Neves? Estaria Moniz a ser irónico? Aperceber-se-ia que ao contar ali dois membros do Governo de Sidónio, estava também a assinalar a solidão política a que votavam o antigo chefe? De qualquer modo este aparecimento de Egas Moniz desligado da política, mesmo na hipótese de um registo irónico, é inconsistente. Porquê?

2º) Porque a afinidade política de Egas Moniz com Azevedo Neves vinha muito de trás. Ambos tinham militado nas fileiras do Partido Progressista, - monárquicos, pois; ambos tinham sido iniciados na Maçonaria - maçons, pois; ambos tinham aderido ao Partido Nacional Republicano (vulgo: Partido Sidonista) – correligionários, pois. O aparente distanciamento de Egas Moniz das coisas da res publica é habitual no registo biográfico que o próprio Egas Moniz se esforçou por impôr, mas não corresponde à verdade dos factos, pelo menos até à queda do Governo de José Relvas, em que Azevedo Neves já não entrou, mas no qual Egas Moniz ainda continuou na qualidade de Ministro dos Negócios Estrangeiros.

3º) O narrador, a dado passo, tentando evitar a monótona repetição dos nomes dos personagens, trata Egas Moniz por “cirurgião”. O deslize não tem gravidade e explica-se provavelmente pela ideia difusa no silogismo comum: se Egas Moniz ganhou o prémio Nobel graças à leucotomia pré-frontal, que consistia numa neurocirurgia, logo Egas Moniz era cirurgião. Na verdade, Egas Moniz era neurologista (talvez até neuropsiquiatra) mas não era cirurgião.

Estas anotações não deslustram em nada a interessantíssima narrativa de Moita Flores. São apenas uma manifestação de desconforto de um leitor ex fabula.

Egas Moniz, Azevedo Neves e Moreira Júnior terão ainda alguns lances comuns nos anos seguintes. A eles voltaremos mais tarde.

Mataram o Sidónio (2)


No seu afã literário de dramatizar gentes e acontecimentos, Moita Flores inventa e recria diálogos, uns mais verosímeis do que outros, mas quase sempre dentro dos limites da razoabilidade histórica.

Asdrúbal d’Aguiar, que é o herói da novela, fala com praticamente todas as entidades ao alcance do acontecimento, incluindo uma sugestiva e fortuita troca de propósitos com Fernando Pessoa no Martinho da Arcada; Manuel Moreira Júnior desafia provocatoriamente magistrados, catedráticos e governadores civis, com um ostensivo e pesado sentido de humor; e Azevedo Neves, então Secretário de Estado do Comércio no Governo de Sidónio, fala com quase todos eles, justificando as suas escolhas políticas (continua monárquico, mas com uma dívida de gratidão a Sidónio), a sua estratégia institucional e os seus pensamentos mais profundos sobre a vida e a morte, a ciência e o direito, a religião e o Estado.

Um desses diálogos ocorre no capítulo “O funeral da Morte” (pp. 116-121, da 1ª edição *), e tem Egas Moniz por interlocutor

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* FLORES, Francisco Moita, Mataram o Sidónio, Casa das Letras, Alfragide, 2010.

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Mataram o Sidónio (1)



O texto de Moita Flores cavalga a sua tese de Doutoramento que, segundo o próprio, versou a mesma matéria: a inconclusiva investigação policial, criminal e médico-legal acerca do atentado que vitimou o então Presidente da República. O fundo histórico e a agilidade literária oferecem um fresco digest do que poderiam ter sido os diálogos e a acção dos personagens principais que os palcos da memória e os documentos da época deixam entrever.
Moita Flores discorre velozmente sobre a agenda médico-legal que tem, nesses idos de 1918, uma espécie de momento zero, com a criação do Instituto Nacional de Medicina Legal e da Polícia de Investigação Criminal. Paradoxalmente, as conveniências e os jogos de força político-partidários mailas suas expressões mediáticas, encarregaram-se de anular a prova negativa que os médicos da equipa de Azevedo Neves (Asdrúbal d’Aguiar, Geraldino Brites e Moreira Júnior) apuraram.
Apesar de ter ficado assente a impossibilidade de José Júlio da Costa, suspeito preso no local e confesso (sob tortura) assassino de Sidónio Pais, - e de, para o efeito, não ter chegado a ir a julgamento - nem a publicação do referido parecer, quatro anos depois, conseguiu demover a crença instalada de que o caso policial tinha sido bem resolvido.


segunda-feira, fevereiro 15, 2010

O "Poder Biográfico" (1)










(clique sobre os gráficos para aumentá-los)

O gráfico extraído automaticamente do "motor de busca" Google dá uma ideia geral acerca das datas mais frequentes a que os documentos acerca de Egas Moniz, disponíveis em rede, estão associados.
As frequências mais elevadas apontam as datas relativas à divulgação dos primeiros resultados da Encefalografia Arterial (que levou à Angiografia Cerebral no início dos anos 30); das "tentativas operatórias" com que foi dada a conhecer a Leucotomia Pré-frontal; e do Prémio Nobel da Fisiologia ou Medicina que lhe foi atribuído, ao cabo de cinco nomeações.










Aquilo a que chamamos "poder biográfico" prolonga-se na informação injectada na web.
Egas Moniz continua a ser mais conhecido de acordo com o perfil que traçou para si próprio.








O cientista que deixou obra feita.