sexta-feira, novembro 19, 2010

Quando as fontes mentem (1)

[click sobre a imagem para aumentá-la]

Na sua edição de ontem (18/11/2010) a revista SÁBADO, (edição em papel) em suplemento intitulado Os melhores hospitais doença a doença, publica, na página 17, o apontamento histórico que aqui reproduzimos. A intenção é louvável; o resultado é lamentável. O Prémio Nobel atribuído a Egas Moniz não se deveu à Angiografia Cerebral mas sim à Leucotomia Préfrontal. Gostaríamos de saber, apesar de tudo, quais terão sido as fontes utilizadas. Sempre poderíamos aprender mais qualquer coisa…

terça-feira, novembro 16, 2010

Como ganhar um Prémio Nobel: algumas sugestões


A edição online de La Recherche publica "Comment obtenir un prix Nobel", artigo interessante, da autoria de Mathieu Nowak, que fornece algumas sínteses estatísticas e outras particularidades do funcionamento da Fundação Nobel.

Num registo meio irónico, termina alertando para o perigo de contracção da nobelite, um tipo de doença que parece atacar alguns cientistas esperançosos. Depois de fornecer receitas para potenciais candidatos ao Prémio, previne-os contra o risco de contrairem a nobelite.

Francamente!

terça-feira, novembro 02, 2010

A 1ª República, os médicos, a saúde e o corpo




A não perder.

Versão virtual também [aqui].

O Catálogo contém bons artigos de Rita Garnel (Comissária da Exposição), "Corpo: Estado, medicina e sociedade no tempo da I República"; de João Lobo Antunes, sobre Egas Moniz, "Algum ilusório sucesso e muitas contrariedades"; de Maria Fátima Nunes, "As sociabilidades médico-científicas"; de Madalena Esperança Pina, "As faculdades de medicina na I República"; de João Rui Pita, "A farmácia na República"; de Alexandre Alegre, "Saúde, higiene e arquitectura escolar"; de Jorge Fernandes Alves, "Saúde e fraternidade"; de José Morgado Pereira, "A psiquiatria no tempo da I República"; e de Jorge Costa Santos, "Corpo desviante".

terça-feira, outubro 12, 2010

Prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia de 2010



Robert G. Edwards


O Prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia foi descerrado este ano a um dos “pais” da Fertilização in Vitro (IVF no acrónimo anglo-saxónico), Robert Geoffrey Edwards, pelo desenvolvimento do método (e suas aplicações clínicas). Imediatamente após o anúncio, o Professor Christer Höög, do Comité Nobel, deu uma curta entrevista (disponível no Site Oficial da Fundação Nobel) acerca de algumas das questões envolvidas.

Christer Höög salientou o carácter inédito do prémio deste ano. Segundo ele,  é a primeira vez que os residentes do Karolinska premeiam a reprodução medicamente assistida, fazendo-o, neste caso, mais de meio século depois da divulgação pública dos primeiros resultados obtidos em laboratório e 37 anos após o nascimento do primeiro "bebé proveta".

A manipulação de embriões suscitou, desde o início, questões religiosas e éticas. Há quem veja neste prémio "tardio" uma espécie de levantamento do embargo ético à manipulação de embriões humanos, coisa que Christer Höög rejeita na referida entrevista.

Há, porém, um outro aspecto muito interessante no discurso de Höög. Justificando a "demora" no reconhecimento da eficácia da Fertilização In Vitro, o porta-voz do Comité Nobel sublinha que os numerosos estudos de acompanhamento forneceram, ao longo dos últimos trinta anos,  uma base sólida para a fundamentação do veredicto. E nas entrelinhas deste último argumento, não pode deixar-se de detectar um sinal: o de que o Comité Nobel reconhece, implicitamente,  nem sempre ter tido desse cuidado...

segunda-feira, outubro 11, 2010

A Medicina na Azulejaria (*)






Um repositório da azulejaria (**) associado à história das doenças e das saúdes, navegando à vista a história da medicina. A autora (***) põe em relação as mitologias e as origens ocidentais dos saberes curativos, entretecidas de apontamentos breves sobre o modus faciendi de físicos, cirurgiões e barbeiros, através de um roteiro da azulejaria portuguesa que atravessa hospitais, igrejas, conventos e palácios, guiando o olhar do leitor com elementos da história das artes e das ciências da saúde.

Ao longo de 89 gravuras que reproduzem peças da azulejaria que contêm os tais traços que o título promete, a docente e investigadora da Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa, identifica os temas associados à sanidade por sábios, santos, deuses e médicos, discorrendo sobre arte, ciência, religião, ilustrando contextos com ditados, comentários,  fábulas e fechando com uma homenagem fulgurante a Abel Salazar que terá dito um dia que O médico que só sabe de medicina, nem de medicina sabe.

Um livro para todos.




(*) PINA, Madalena Esperança, Traços da Medicina na Azulejaria de Lisboa, Casal de Cambra, Caleidoscópio, 2010.

(**) Tal como reza a sinopse da WOOK, ” A Azulejaria é como se sabe uma arte muito própria de Portugal, que atingiu um destaque na cultura e na identidade do nosso país. Esta obra procura dar a conhecer de uma forma objectiva e realista as representações da azulejaria que se prendem com a temática da Medicina reforçando a sua vertente mais humanista. A autora relacionou ainda este contexto a outras áreas afins como a acção médica e patológica, a higiene e a assistência, os ciclos temáticos sobre os cinco sentidos e os quatro elementos, a iconografia religiosa e outros. A obra debruçou-se nos azulejos produzidos entre o século XVII e a década de 90 do século XX na área de Lisboa.”

(***) Madalena Esperança Pina é docente de História da Medicina na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa desde 2001, onde obteve o grau de Doutor. Licenciou-se em História, variante de História da Arte, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa . É também investigadora do CEHFCI – Centro de Estudos de História e Filosofia da Ciência.

quarta-feira, agosto 11, 2010

Mataram o Sidónio (4)

João Alberto Pereira de Azevedo NevesAntónio Caetano de Abreu Freire Egaz Moniz
Azevedo Neves e Egas Moniz


A proximidade e cumplicidade de Azevedo Neves e de Moreira Júnior com Egas Moniz, tal  como aflorei no anterior poste, vinham muito de trás. Da Câmara dos Deputados da Monarquia Constitucional, em que conviveram; do Partido Progressista, de que eram membros (Moniz viria a afastar-se apenas em 1905, acompanhando a chamada Dissidência Progressista liderada por José Maria d’Alpoim). Cruzaram-se, pois, na vida política, tanto quanto na vida Universitária, Médica, Associativa e Hospitalar, em vários momentos e fases.

Quando, em 1928, Egas Moniz é nomeado, pela 1ª vez, para o Prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia(*), Azevedo Neves encontra-se entre os nomeadores, enaltecendo a importância médico-científica da sua Encefalografia Arterial; e em 1937, por altura da 3ª nomeação de Egas Moniz para o mesmo prémio, as duas cartas que dão entrada no Instituto Karolinska, vão assinadas, respectivamente, por Azevedo Neves (de novo) e por Moreira Júnior, destacando, desta vez, quer a já  mencionada Encefalografia Arterial, quer a Leucotomia pré-frontal que tanta controvérsia viria a levantar.

Se confrontarmos a reacção de Egas Moniz, ficcionado por Moita Flores, ao excurso metafísico de Azevedo Neves acerca dos limites do “bisturi”, não podemos deixar de sorrir e lembrar que, se assim pensasse, Azevedo Neves não nomearia, em coerência, Egas Moniz para o Prémio Nobel de 1937.

Diz Azevedo Neves (ficcionado):

Considero que a nossa dimensão ontológica escapa ao bisturi do cirurgião e não é perceptível na bancada de autópsias. Abrimos cadáveres, jamais dissecaremos um espírito. A razão já não habita o corpo morto. Dissolve-se na morte? Emigra para o mundo dos espíritos? Encontra-se com os anjos que ladeiam São Pedro? Confesso que não sei.”(**)

Quais teriam sido, anos mais tarde, as reflexões de Azevedo Neves e de Moreira Júnior para apoiarem a Psicocirurgia?

Mistério.


(**) FLORES, Francisco Moita, Mataram o Sidónio!, Alfragide, Casa das Letras, 2010, p. 118.

terça-feira, agosto 10, 2010

Mataram o Sidónio (3)


O diálogo Azevedo Neves – Egas Moniz estabelece-se à saída do cemitério do Alto de S. João, após o funeral da mulher de Asdrúbal d’Aguiar, vítima da pneumónica. Asdrúbal ocupava então o cargo de Director interino do Instituto de Medicina Legal, na ausência de Azevedo Neves. Tinha sido, também, discípulo de Egas Moniz. À mesma hora, realizavam-se, a caminho do Panteão Nacional, as cerimónias fúnebres de Sidónio Pais. Egas Moniz estranha que Azevedo Neves, membro do Governo de Sidónio, não esteja lá a prestar-lhe as suas últimas homenagens.

A conversa afigura-se interessante e profunda, em redor dos limites do conhecimento científico, do espiritismo e da metafísica, mas há três aspectos que poderiam equivocar o leitor historicamente incauto.

1º) Egas Moniz era, tal como Azevedo Neves (a quem parece admoestar pela ausência das exéquias fúnebres de Sidónio), membro do mesmo Governo, sobraçando a Secretaria dos Negócios Estrangeiros. Era, portanto, no Governo de Sidónio, colega de Azevedo Neves. Qual o sentido da chamada de atenção de Egas Moniz a Azevedo Neves? Estaria Moniz a ser irónico? Aperceber-se-ia que ao contar ali dois membros do Governo de Sidónio, estava também a assinalar a solidão política a que votavam o antigo chefe? De qualquer modo este aparecimento de Egas Moniz desligado da política, mesmo na hipótese de um registo irónico, é inconsistente. Porquê?

2º) Porque a afinidade política de Egas Moniz com Azevedo Neves vinha muito de trás. Ambos tinham militado nas fileiras do Partido Progressista, - monárquicos, pois; ambos tinham sido iniciados na Maçonaria - maçons, pois; ambos tinham aderido ao Partido Nacional Republicano (vulgo: Partido Sidonista) – correligionários, pois. O aparente distanciamento de Egas Moniz das coisas da res publica é habitual no registo biográfico que o próprio Egas Moniz se esforçou por impôr, mas não corresponde à verdade dos factos, pelo menos até à queda do Governo de José Relvas, em que Azevedo Neves já não entrou, mas no qual Egas Moniz ainda continuou na qualidade de Ministro dos Negócios Estrangeiros.

3º) O narrador, a dado passo, tentando evitar a monótona repetição dos nomes dos personagens, trata Egas Moniz por “cirurgião”. O deslize não tem gravidade e explica-se provavelmente pela ideia difusa no silogismo comum: se Egas Moniz ganhou o prémio Nobel graças à leucotomia pré-frontal, que consistia numa neurocirurgia, logo Egas Moniz era cirurgião. Na verdade, Egas Moniz era neurologista (talvez até neuropsiquiatra) mas não era cirurgião.

Estas anotações não deslustram em nada a interessantíssima narrativa de Moita Flores. São apenas uma manifestação de desconforto de um leitor ex fabula.

Egas Moniz, Azevedo Neves e Moreira Júnior terão ainda alguns lances comuns nos anos seguintes. A eles voltaremos mais tarde.

Mataram o Sidónio (2)


No seu afã literário de dramatizar gentes e acontecimentos, Moita Flores inventa e recria diálogos, uns mais verosímeis do que outros, mas quase sempre dentro dos limites da razoabilidade histórica.

Asdrúbal d’Aguiar, que é o herói da novela, fala com praticamente todas as entidades ao alcance do acontecimento, incluindo uma sugestiva e fortuita troca de propósitos com Fernando Pessoa no Martinho da Arcada; Manuel Moreira Júnior desafia provocatoriamente magistrados, catedráticos e governadores civis, com um ostensivo e pesado sentido de humor; e Azevedo Neves, então Secretário de Estado do Comércio no Governo de Sidónio, fala com quase todos eles, justificando as suas escolhas políticas (continua monárquico, mas com uma dívida de gratidão a Sidónio), a sua estratégia institucional e os seus pensamentos mais profundos sobre a vida e a morte, a ciência e o direito, a religião e o Estado.

Um desses diálogos ocorre no capítulo “O funeral da Morte” (pp. 116-121, da 1ª edição *), e tem Egas Moniz por interlocutor

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* FLORES, Francisco Moita, Mataram o Sidónio, Casa das Letras, Alfragide, 2010.

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Mataram o Sidónio (1)



O texto de Moita Flores cavalga a sua tese de Doutoramento que, segundo o próprio, versou a mesma matéria: a inconclusiva investigação policial, criminal e médico-legal acerca do atentado que vitimou o então Presidente da República. O fundo histórico e a agilidade literária oferecem um fresco digest do que poderiam ter sido os diálogos e a acção dos personagens principais que os palcos da memória e os documentos da época deixam entrever.
Moita Flores discorre velozmente sobre a agenda médico-legal que tem, nesses idos de 1918, uma espécie de momento zero, com a criação do Instituto Nacional de Medicina Legal e da Polícia de Investigação Criminal. Paradoxalmente, as conveniências e os jogos de força político-partidários mailas suas expressões mediáticas, encarregaram-se de anular a prova negativa que os médicos da equipa de Azevedo Neves (Asdrúbal d’Aguiar, Geraldino Brites e Moreira Júnior) apuraram.
Apesar de ter ficado assente a impossibilidade de José Júlio da Costa, suspeito preso no local e confesso (sob tortura) assassino de Sidónio Pais, - e de, para o efeito, não ter chegado a ir a julgamento - nem a publicação do referido parecer, quatro anos depois, conseguiu demover a crença instalada de que o caso policial tinha sido bem resolvido.


segunda-feira, fevereiro 15, 2010

O "Poder Biográfico" (1)










(clique sobre os gráficos para aumentá-los)

O gráfico extraído automaticamente do "motor de busca" Google dá uma ideia geral acerca das datas mais frequentes a que os documentos acerca de Egas Moniz, disponíveis em rede, estão associados.
As frequências mais elevadas apontam as datas relativas à divulgação dos primeiros resultados da Encefalografia Arterial (que levou à Angiografia Cerebral no início dos anos 30); das "tentativas operatórias" com que foi dada a conhecer a Leucotomia Pré-frontal; e do Prémio Nobel da Fisiologia ou Medicina que lhe foi atribuído, ao cabo de cinco nomeações.










Aquilo a que chamamos "poder biográfico" prolonga-se na informação injectada na web.
Egas Moniz continua a ser mais conhecido de acordo com o perfil que traçou para si próprio.








O cientista que deixou obra feita.

terça-feira, outubro 27, 2009

60 Anos do Prémio Nobel da Medicina (2)


TSF



A TSF, - programa Mais Cedo ou Mais Tarde, de João Paulo Meneses - assinalou hoje o sexagésimo aniversário da atribuição do Prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia a Egas Moniz. Entrevista aqui.

domingo, outubro 25, 2009

60 Anos do Prémio Nobel da Medicina (1)


Querem «desnobelizar» Egas Moniz

Excelente peça de Licínio Lima, hoje, no DN Magazine [também disponível aqui]. Duas correcções de pormenor: 1) Egas Moniz não era neurocirurgião, mas neurologista; 2) Manuel Correia trabalha efectivamente no IST mas não é professor, como vem no texto, mas técnico superior de informação e divulgação.

sexta-feira, julho 31, 2009

Défices e alheamentos (2)










A tese que sustenta uma causalidade linear entre a apresentação das chimpanzés de Fulton no Congresso de Londres, em 1935, e o arranque, em Lisboa, das primeiras leucotomias, é demasiado simplista. Não é pelo facto de se ter instalado nas histórias acerca da psicocirurgia que se torna mais consistente. É altamente improvável que um qualquer neurologista [1] que não tivesse reflectido longamente sobre o papel dos lobos frontais, se dispusesse, de um momento para o outro, a enveredar, sem mais, pela psicocirurgia. Há uma série de indícios que levam a atribuir à experiência de Fulton, quanto muito, uma oportunidade de confirmação.

Todavia, o próprio Fulton, depois de ter achado má ideia “saltar” dos macacos para os humanos, alimentou, também, a versão de que os seus trabalhos e os do seu colega Carlyle Jacobsen, tinham estado na génese da leucotomia de Moniz. Para reforçar essa história de que Moniz soltara o seu eureka em Londres, diante das chimpanzés, Olivercrona, no discurso oficial de apresentação dos vencedores do prémio Nobel 1949 [2], destacou os trabalhos anteriores de Fulton, reforçando a tese de que o encontro de Moniz com Fulton, em 1935, fora decisivo.

De qualquer modo, o estranho é que, havendo dois cientistas norte americanos a fazer investigação sobre as funções dos lobos frontais em grandes símios, Moniz, após tomar conhecimento da fase de pesquisa em que se encontravam, tenha decidido dar o “salto” para os humanos, sem assegurar a confirmação experimental, ainda nos símios, antes de efectuar a translação. O pouco que se conhecia e se tinha publicado à época, aconselharia a continuar, ainda, com as experiências em chimpanzés até serem adquiridos conhecimentos mais sólidos na matéria. A experimentação em humanos, apesar de usada e abusada na “era dos extremos” [3], tinha merecido a Moniz, na preparação da Encefalografia Arterial, uma translação mais faseada e cautelosa.



[1] Entre outros, Walter Freeman, participante no mesmo Congresso, e mais tarde um dos maiores entusiastas da psicocirurgia, poderia, igualmente, ter sido sensibilizado pela experiência das chimpanzés e tido também o seu “eureka”...

[2] Olivercrona, Herbert., (2006), "Avaliação da Candidatura de Egas Moniz em 1949" in Correia, Manuel., Egas Moniz e o Prémio Nobel, Coimbra, Imprensa da Universidade.

[3] Ver, entre outro o livro de Pappworth, (1967), Human Guinea Pigs, London, Penguin.

segunda-feira, julho 27, 2009

Défices e alheamentos (1)

Em praticamente toda a literatura que faz a avaliação da psicocirurgia surgem críticas às insuficiências teóricas da exposição conceptual de Egas Moniz. As ideias que expôs acerca do funcionamento do cérebro, do papel dos lobos frontais e dos “centros ovais” dos lobos pré-frontais, não explicitavam, de acordo com os resultados obtidos, o carácter dos fenómenos que a lesão induzida repercutia na dinâmica psíquica.

Cerca de um ano após as primeiras leucotomias, Egas Moniz e Diogo Furtado expunham a fragilidade teórica da empresa:

(...) nous voulons signaler que la doctrine de la fixation fonctionnelle de certains groupements cellulo-connectifs, exposée dans ce livre [Tentatives opératoires], n'est pas plus qu'une hypothèse de travail, et n'a aucune prétention de jouer le rôle de théorie pathogénique des psychoses dite fonctionnelles.

Le mécanisme par lequel l'intervention destructive de susbtance blanche des lobes préfrontaux agit favorablement sur certains tableaux psychopathologiques nous est - il faut l'avouer - tout à fait inconnu.[1]

Neste artigo, além de admitirem desconhecer o "mecanismo" que explica as melhoras de uma parte dos doentes, fazem várias observações cuja consistência permanecerá em trabalhos futuros.

C'est dans les psychoses, dont le symptôme dominant est l'angoisse, que la méthode s'est montrée le plus efficace: on a rapporté plusieurs cas de mélancolie anxieuse, dont l'évolution jusque là chronique et irrémissible a été arrêtée et le malade guéri par l'intervention.[2]

e outras que não virão a ser confirmadas

(...) la destruction considérable que nous provoquons dans le centre oval des lobes en question n'arrive à produire aucun symptôme clinique.[3]

Nos anos seguintes, mercê do efeito Mateus [4] e de alguns traços dominantes da cultura científica dos médicos, a Leucotomia Pré-frontal e neurocirurgias derivadas, foram replicadas um pouco por todo o lado. Quando, em 1948, o 1º Congresso Internacional de Psicocirurgia teve lugar em Lisboa, os adeptos da psicocirurgia, mais ou menos entusiastas, conheciam já, bastante bem, os riscos, os efeitos secundários (as tais alterações da personalidade...) e, de um modo geral, sustentavam que a prática da leucotomia deveria tender para intervenção de último recurso.

Na sua Última Lição [5], em 1944, Moniz reconhece algumas fragilidades teóricas no edifício conceptual da Leucotomia Préfrontal.

Se me sobrar vida e disposição, ocupar-me-ei ainda com desenvolvimento do aspecto teórico da questão, pois se a operação foi acolhida, por muitos, com interesse, as suas bases não mereceram, entre os próprios psiquiatras organicistas, unanimidade de vistas. (...) A realidade dos resultados obtidos sobreleva contudo as divergências no campo das hipóteses iniciais.[6]

Incomodava-o, sobretudo, que os neurologistas que partilhavam com ele uma concepção organicista, pusessem reservas às suas explicações e indicações. O facto de se disponibilizar para desenvolver a explanação teórica da leucotomia, atesta, pelo menos em certa medida, sensibilidade e consideração por algumas das críticas que lhe foram endereçadas.

Hessen-Möller, comentando a nomeação para o Nobel em 1944, refere-se também a este aspecto.

(...) as reflexões teóricas que levaram Moniz ao seu método parecem tão vagas, e o material do próprio Moniz por causa do acompanhamento curto e relativamente superficial a seguir às intervenções cirúrgicas não chega para convencer.[7]

Finalmente, em 1955, na conferência proferida acerca dos ataques à leucotomia - A Leucotomia está em Causa [8] - Moniz desvaloriza as reservas que lhe são colocadas no plano teórico, designadamente as sublinhadas pela lei da União Soviética que passou a interditar a prática da leucotomia. Neste último caso, a interpelação teórica teve origem no Conselho Superior de Saúde da URSS que

(...) examinou a questão da leucotomia pré-frontal como método terapêutico e reconheceu que esta operação não tinha bases teóricas; a aplicação da leucotomia pré-frontal contradiz todos os princípios fundamentais da doutrina de Pavlov[9]

Visando, antes de tudo, a questão teórica, Moniz acrescenta

Se isso significa dizer que as não aceitam [as bases teóricas da leucotomia] , está bem; mas os resultados é que valem e são reconhecidos pela grande maioria dos neuro-psiquiatras ocidentais e americanos.

(...) os influxos que atravessam o cérebro podem seguir diferentes caminhos para alcançar o mesmo fim.[10]

Por fim, sintetiza a procedência de duas séries de provas:

Dum lado, as que a defendem [a leucotomia] no campo médico, filosófico e teológico; do outro as que a condenam por motivos mais teóricos do que práticos, indo até à sua proibição num grande país oriental.[11]

Face às dificuldades que lhe foram surgindo na descrição de um modelo dinâmico que explicasse a relação entre as alterações produzidas no córtex e os resultados quer favoráveis, quer desfavoráveis, às suas teses, Moniz admitiu, antes de receber o prémio Nobel, que se impunha desenvolver os aspectos teóricos da leucotomia. Depois de 1950, tendeu a desvalorizar as fragilidades teóricas que tinha constatado antes, argumentando com a força da evidência dos resultados.

Moniz remetia-se assim a uma postura empiricista, como se fosse possível, na divulgação dos resultados da investigação científica, dispensar a teoria para interpretar os resultados, compreender os processos e prosseguir a investigação.



[1] Moniz, Egas e Furtado, Diogo., (1937), “Essais de traitement de la schizophrénie par la leucotomie préfrontale” in Annales Médico-Psychologiques, Nº 2, Juillet, Paris, Masson et Cie Editeurs, p.1.

[2] Ibidem.

[3] Ibidem.

[4] Efeito que pretende explicar a ampliação do prestígio de quem já se posicionou na comunidade científica e a dificuldade em se fazer ouvir de quem ainda não o conseguiu. Merton, Robert K., (1973), The Sociology of Science. Theoretical and Empirical Investigations, Chicago, The Uiversity of Chicago Press, pp. 439-459.

[5] Moniz, Egas., (1944), A última Lição, Lisboa, Portugália Editora.

[6] Idem, p.25.

[7] Hessen-Möller, (2006), "Parecer sobre a nomeação de Egas Moniz para o Prémio Nobel de 1944" in Correia, Manuel., Egas Moniz e o Prémio Nobel, Coimbra, Imprensa da Universidade, 131.

[8] Moniz, Egas., (1954), A leucotomia está em causa, Lisboa, Academia das Ciências de Lisboa.

[9] Ibidem, p. 48

[10] Ibidem, p. 49

[11] Ibidem, p. 51

sexta-feira, julho 24, 2009

Tempo e Poder (2)
























Desenho de Ramón y Cajal, extraído do 2º volume do seu livro
"Textura del Sistema Nervioso del Hombre y de los Vertebrados",
publicado em Madrid em 1904.


É, pois, nesta "Era dos Extremos" que corre a história do prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia de 1949, atribuído ex-aequo ao neurologista português António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, da Universidade de Lisboa, e ao neurofisiologista suíço Walter Rudolf Hess, da Universidade de Zurique.

Moniz foi premiado pelo valor terapêutico da Leucotomia Pré-frontal no tratamento de certas psicoses; Hess, pela descoberta da organização funcional do cérebro médio (interbrain) na coordenação da actividade dos órgãos internos (digestão, circulação e pressão sanguínea, respiração, etc.), tendo Walter Hess, no dizer de Herbert Olivercrona, por ocasião do discurso oficial de apresentação dos nobelizados [1], respondido “brilhantemente a algumas questões difíceis acerca da localização de funções fisiológicas no cérebro”.

A ponte temática que parecia unir os dois laureados era, pois, a da “localização”, apesar de Hess orientar as suas pesquisas genericamente para o conhecimento cumulativo das funções cerebrais, enquanto a pesquisa de Moniz, subentendendo também um melhor conhecimento das funções dos lobos frontais, desembocava numa terapêutica neurocirúrgica. No caso de Moniz, tratava-se do que a evidência empírica, até então recolhida, fazia crer acerca do papel que os lobos frontais desempenhavam no comportamento e na personalidade, afectando a capacidade de julgamento, a adaptabilidade social e outras funções de integração intelectual; no caso de Hess, o mapeamento do diencéfalo, orientado pela estimulação eléctrica, descrevia as áreas de coordenação da circulação e pressão sanguínea, movimentos peristálticos do aparelho digestivo, regulação da temperatura e respiração.

Hess acrescentava novos conhecimentos, tomando, como ponto de partida, o cérebro médio dos gatos; Moniz propunha uma nova forma de neurocirurgia (a que chamou psicocirurgia) com valor terapêutico em “certas psicoses”.

Foram estes os pontos de chegada. O Comité Nobel do Karolinska Institutet rendia-se aos dois neurocientistas (permita-se-nos o vocábulo anacrónico) cujo trabalho experimental, no caso de Hess, respondia a perguntas cruciais sobre os automatismos do sistema nervoso e, no caso de Moniz, confirmava o papel específico dos lobos frontais na actividade intelectual e afectiva, pois que, uma vez lesionados, produziam alterações significativas no comportamento dos pacientes.

O ponto de partida de Walter Rudolf Hess fora 1933. Nesse ano foi nomeado pela primeira vez. Tinha, então, 52 anos. Ao cabo de mais 11 nomeações, (12 nomeações em 16 anos) viu finalmente a sua candidatura aprovada. As nomeações basearam-se, em grande parte, nos trabalhos a que se consagrou desde praticamente o início da sua carreira científica, orientados para o mapeamento das funções de coordenação automática do diencéfalo. Sobreviveu quase um quarto de século ao prémio, gozando do raro (e desejado) estatuto de Nobelizado.

O ponto de partida de Egas Moniz foi a nomeação de 1928 (aos 54 anos) com base na então chamada “encefalografia arterial”. Voltou a ser nomeado em 1933, 1937, 1944 e, por fim, em 1949, ganhou o prémio. Sobreviveu-lhe apenas 6 anos..

A base de todas as nomeações foi a Angiografia Cerebral, a que os nomeadores acrescentam, a partir de 1937, a Leucotomia Pré-frontal. O facto de o Comité Nobel ter optado por premiar Moniz pela Leucotomia e não pela Angiografia, fez e ainda hoje faz correr rios de tinta e ao alicerçar de hipóteses criativas acerca da sua justificação.



[1] AAVV.,(1964), Nobel Lectures, Physiology or Medicine 1942-1962, Elsevier Publishing Company, Amsterdam.

quinta-feira, julho 23, 2009

Tempo e Poder (1)

A criação, institucionalização e actividade da Fundação Nobel é indissociável da imagem que guardamos do século XX. A dinamite que Alfred Nobel sintetizou, patenteou e vendeu, proporcionou-lhe a enorme fortuna, da qual legará uma parte para a institucionalização do futuro prémio. O valor das descobertas científicas para a melhoria do bem-estar da humanidade, inspirou, assim, o gesto de distribuir anualmente pelos merecedores de tal distinção, o diploma, a medalha e as 150 mil coroas suecas [1] que passaram a constituir o Prémio Nobel. Aí está o cocktail ideológico da viragem do século: estimular a actividade científica através do reconhecimento de cientistas que tivessem alcançado resultados extraordinários, humanamente benéficos, no respectivo ramo científico. As origens explosivas do prémio rapidamente foram controladas, mediatizadas e normalizadas por um sinédrio de sábios escandinavos que se blindou por detrás de três disposições que conviveram durante todo o século XX (e até hoje) com as culturas científicas existentes.

A 1ª disposição é a do controlo temporal: contra o desejo testamental de Alfredo Nobel, passaram a atribuir o prémio, sem olhar à norma que o destinava a quem mais se tivesse destacado nos respectivos sectores no decurso do ano anterior. As vantagens e os inconvenientes dessa adaptação têm sido discutidos mas, independentemente da bondade das linhas de argumentação, o acto de poder que contraria o testamento, permanece.

A 2ª disposição é a do segredo. Nos 50 anos subsequentes à atribuição do prémio, os respectivos processos de nomeação, avaliação tal como as actas e o registo dos debates internos, são mantidas secretas pela Fundação [2]. Ao tornar o debate em torno dos nomeados e a respectiva avaliação científica, matérias estritamente privadas, insusceptíveis de escrutínio, devido à classificação secreta da documentação atinente, a Fundação recusa frontalmente o contraditório, impondo o seu juízo inapelável.

A 3ª disposição consiste no modo de entrega dos prémios, tornando-os um acto cerimonial que envolve a autoridade do Estado e das Monarquias Sueca e Norueguesa, conferindo aos rituais de entrega final dos prémios uma selagem indelével.

Estas disposições não dissiparam inteiramente as polémicas que ficaram coladas a alguns dos prémios atribuídos, nem dissolveram o ambiente de controvérsia que rodeou muitos outros, mas a sua sobrevivência conta-nos uma história, a par de outras, - a história da (co)produção de uma super-elite: uma elite saída das elites científicas de diferentes países [3].

O Prémio Nobel foi o prémio do Século e conta, à sua própria escala, o processo científico do século XX. Quer as omissões, quer as justificações, documentam abundantemente, as esperanças, os projectos e as ideias que agitaram as ciências e que fizeram vencimento na Real Academia Sueca (para os prémios da física, química e economia), no Instituto Karolinska (para o prémio da Medicina ou Fisiologia), na Academia Sueca (para o prémio da literatura) e no Comité Norueguês (para o prémio da Paz).

Tomando por empréstimo o título com que Eric Hobsbawm o baptizou, (sobretudo relativamente ao período que vai de 1914 a 1992) recordamo-lo como “A Era dos Extremos” [4], querendo significar, por aí, que não terá havido outro intervalo secular tão pejado de violência de tal modo intensa, empreendimentos tão arriscados, realizações marcantes, profundas, espantosas e terríveis.

Aos que assim falam por terem nascido e vivido nesses anos, deve ser descontada a tendência que sempre se verificou de exagerarmos as grandezas e misérias do tempo das nossas vidas. Contudo, basta evocar o triunfo dos programas aeroespaciais (chegada do homem à Lua), por um lado, e o potencial destrutivo das duas bombas atómicas lançadas sobre Hiroxima e Nagasáqui, por outro lado, para admitirmos que o Século XX foi diferente dos anteriores, não apenas pelas esperanças que desencadeou no alargamento dos horizontes do conhecimento, mas também pelas perversões, destruições e desumanidades a que deu azo.



[1] O Prémio começou por ser de 150.782 coroas suecas, em 1901, e é hoje de 10.000.000. Cfr Em 1949 valia 156.290 coroas suecas. http://nobelprize.org/nobel_prizes/peace/amount.html

[2] Até à alteração estatutária de 1974, a Fundação Nobel mantinha os seus arquivos em segredo absoluto. A regra dos 50 anos é assim vista como uma cedência pela Fundação…

[3] Conceito proposto por Harriet Zuckerman no seu estudo acerca da “população Nobel” - The Scientific Elite. Nobel laureates in the United States, New York, Free Press, 1977.

[4] Hobsbawm, Eric., (1996), A era dos extremos. Breve história do sécilo XX - 1914-1991, Lisboa, Presença.

terça-feira, novembro 25, 2008

Bibliografia (2)


Edição de 1936, da Editora Masson. Egas Moniz era agilíssimo a registar as suas realizações científicas, acautelando, assim, apropriações indevidas. Para tal, já nesse tempo, não era suficiente publicar em português...

Anos antes, na mesma editora, dera à estampa Diagnostic des tumeurs cérébrales et épreuve de l'encéphalographie artérielle, em 1931, e L'Angiographie Cérebrale, em 1934.

Cortesia do Centro de Estudos Egas Moniz, com um agradecimento especial à Dra. Clara Pires.

segunda-feira, novembro 24, 2008

Bibliografia (1)


Tempos atrás, escrevi um pequeno artigo para a Análise Social. Aqui fica arquivado para quem nele vier a ter interesse.

sexta-feira, outubro 10, 2008

Nobel da Medicina 2008



O Prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia deste ano foi dividido por três: Harald zur Hausen (da Alemanha), e Françoise Barré Sinoussi com Luc Montagnier (da França). Mais pormenores no site da Fundação Nobel .

No PÚBLICO de hoje, Carlos Fiolhais escolhe um curioso ângulo de abordagem para esta problemática, chamando a atenção para o "facto" de Portugal, apesar das ideias de senso comum que circulam nesta matéria, ir à frente de países como a Espanha e o Japão. O artigo intitula-se "Portugal ainda à frente do Japão" e vem na página 45 da edição em papel.

Como é que Portugal com os "seus" dois prémios Nobel (Egas Moniz, Medicina ou Fisiologia,1949, e José Saramago, Literatura, 1998) consegue ir à frente da Espanha e do Japão?

Carlos Fiolhais, num registo que oscila entre a razão estatística, a ironia e o humor, explica:

"(...) uma comparação razoável entre os vários países tem de levar em conta o tamanho das respectivas populações: ora o Japão, com 128 milhões de habitantes, tem só 0,12 prémios por milhão de habitantes, ao passo que nós, com 11 milhões de habitantes, temos 0,18 prémios por milhão de habitantes. Além de estarmos à frente do Japão, estamos também à frente da Espanha, que não passa de 0,15 prémios por milhão de habitantes (tem 5 Nobel na Literatura e 2 na Medicina para uma população que é quatro vezes a nossa), e muito à frente do Brasil, que não tem nenhum Nobel. Se nós temos um défice na classificação dos Nobel por habitante (21º lugar) a Espanha e Brasil têm défices maiores."

No entanto, como o autor do artigo enfatiza adiante, "A nossa distância em relação ao Japão é abismal, pois esse país gasta 3,1% do seu PIB, que é, aliás, bem maior do que o nosso, enquanto nós ficamos pelos 0,8 por cento, menos de metade da média europeia (dados de 2005)."

Com esta (e outras) atempadas considerações, Carlos Fiolhais remete, indirectamente, para a solução de muitos enigmas que obscurecem as questões científicas: a "justeza" dos critérios na atribuição dos prémios; as políticas públicas de Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação, incluindo, é claro, o esforço privado; e a gestão das agendas de investigação, condicionam decisivamente a valorização da produção científica.

A estatística parcial é... demasiado parcial.

Conquanto, Carlos Fiolhais prossiga, convicto de que "Ao contrário do que acontece na literatura e na Paz, os Prémios Nobel na Física e na Química raramente são controversos", não se descortina a "medida" que o levou ao advérbio de modo.

Estará Carlos Fiolhais a "ocultar" por detrás de nova arquitectura estatística (parcimoniosa) o inverso do que afirma? Ou, pura e simplesmente não confere importância às inúmeras controvérsias que se vão sucedendo nas áreas que apontou? 

domingo, agosto 31, 2008

Evocações (1)


Passei uma destas manhãs pelo Hospital de Santa Marta. Ia à cata de marcas ou inscrições associadas verdadeiro proprietário deste blog. Tive a sorte de ser recebido pela Dra. Célia Pilão, Administradora Hospitalar. Competente e amável, acompanhou-me numa breve visita a alguns dos principais locais com importância patrimonial histórica.


Hospital de Santa Marta, fachada principal - antigo convento de Santa Marta, Armando Serôdio, 1968, Arquivo Municipal de Lisboa, AFML - A63039



Dessa visita, deixarei aqui umas quantas anotações e imagens.


Mas onde está Egas Moniz?

Em 1º lugar, fiquei surpreendido pela ausência de referências ao Professor Egas Moniz no Hospital de Santa Marta. Depois de ter dirigido, neste hospital, o Serviço de Neurologia, sendo, ao mesmo tempo, Catedrático de Neurologia da Faculdade de Medicina de Lisboa, que ali foi criada com a reforma do ensino universitário da 1ª República, Egas Moniz desenvolveu, também naquelas instalações, a investigação científica que conduziria à Angiografia Cerebral (1927) e à Leucotomia Pré-frontal (1935). Cinco anos após a sua jubilação, foi distinguido com o Prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia (1949). Este conjunto de distinções tornou-o uma figura incontornável nos estudos acerca da Ciência e da Medicina. Por isso surpreende não se encontrar (à 1ª vista, pelo menos) qualquer alusão, placa evocativa ou nota histórica que lhe diga respeito.


Soslaio dos Claustros do Hospital de Santa Marta


É certo que no actual Hospital Universitário (Santa Maria, inaugurado em 1954) damos com o seu nome por todo o lado. A começar pela toponímia (Avenida Professor Doutor Egas Moniz), passando pela designação de edifícios, salas, um Centro de Estudos, um pequeno Museu, e uma estátua em bronze executada pelo escultor Euclides Vaz e erigida em frente da entrada da Faculdade de Medicina em 1974, por altura da celebração dos 100 anos do seu nascimento.

Tal não obsta a que, em Santa Marta, a ausência de quaisquer alusões ao 1º Nobel português intrigue e interpele. Apesar de tudo, trabalhou lá durante cerca de 33 anos...

Porque será?

PS

De súbito, a um canto de uma sala de espera, uma marquesa (ainda por catalogar), constitui a excepção.