sexta-feira, janeiro 10, 2014

Eusébio: a última finta


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Panteão Nacional, Lisboa

Eusébio recebeu a bola (um passe rápido de Coluna) a meio-campo. Levantou os olhos e deu-se conta do espaço que restava até à entrada da grande área do adversário. Diferentemente de outras vezes em que a sua energia, rapidez e habilidade foram a chave do remate certeiro à baliza oponente, desta vez sentiu-se como se levado pelo ar. Deixava para trás os campos de futebol, o convívio quotidiano com amigos e familiares, ao encontro do personagem histórico que homens e instituições apropriam e tornam mais ou menos notável, conforme os casos.

Deixava para trás numerosos intelectuais, mulheres e homens das artes e das ciências. A comoção agitava os portugueses que assentiam, uns espontaneamente, outros menos, que perderamos um herói do futebol, um craque internacional, uma estrela do Benfica e da Seleção Nacional.

Subia agora ao Panteão Nacional, após um drible sensacional. Centenas de artistas, cientistas, políticos e outros homens e mulheres de popularidade variável mas de créditos firmados. Aqui para nós, a última finta a que os deputados da Assembleia da República se renderam, não sem um acidulado comentário da sua presidente e um ronceiro silêncio dos que desaprovam estas ondas emocionais em que não adianta contrariar a vox populi, foi a que Eusébio foi levado a fazer aos dois únicos prémios Nobel que gentes portuguesas receberam no século passado. Egas Moniz (1874-1955) que recebeu o prémio Nobel da Fisiologia ou Medicina em 1949, e José Saramago (1922-2010) que recebeu o da Literatura em 1998 foram ultrapassados neste vórtice de gemidos e lágrimas que acompanhou as cerimónias fúnebres.

Suponho que, se estivessem cá para ver, não se espantariam por aí além. Sabiam muito bem o que a casa gasta. Mas imagino que, pelo menos, teriam tido a cumplicidade de uma piscadela de olhos.

Pelo menos isso.  

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