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Panteão Nacional, Lisboa |
Eusébio recebeu a bola (um passe rápido de Coluna) a meio-campo. Levantou
os olhos e deu-se conta do espaço que restava até à entrada da grande área do
adversário. Diferentemente de outras vezes em que a sua energia, rapidez e
habilidade foram a chave do remate certeiro à baliza oponente, desta vez
sentiu-se como se levado pelo ar. Deixava para trás os campos de futebol, o
convívio quotidiano com amigos e familiares, ao encontro do personagem
histórico que homens e instituições apropriam e tornam mais ou menos notável,
conforme os casos.
Deixava para trás numerosos intelectuais, mulheres e homens das artes e das
ciências. A comoção agitava os portugueses que assentiam, uns espontaneamente,
outros menos, que perderamos um herói do futebol, um craque internacional, uma
estrela do Benfica e da Seleção Nacional.
Subia agora ao Panteão Nacional, após um drible sensacional. Centenas de
artistas, cientistas, políticos e outros homens e mulheres de popularidade variável
mas de créditos firmados. Aqui para nós, a última finta a que os deputados da
Assembleia da República se renderam, não sem um acidulado comentário da sua
presidente e um ronceiro silêncio dos que desaprovam estas ondas emocionais em
que não adianta contrariar a vox populi,
foi a que Eusébio foi levado a fazer aos dois únicos prémios Nobel que gentes
portuguesas receberam no século passado. Egas Moniz (1874-1955) que recebeu o
prémio Nobel da Fisiologia ou Medicina em 1949, e José Saramago (1922-2010) que recebeu
o da Literatura em 1998 foram ultrapassados neste vórtice de gemidos e lágrimas
que acompanhou as cerimónias fúnebres.
Suponho que, se estivessem cá para ver, não se espantariam por aí além.
Sabiam muito bem o que a casa gasta. Mas imagino que, pelo menos, teriam tido a
cumplicidade de uma piscadela de olhos.
Pelo menos isso.