segunda-feira, janeiro 10, 2011

Quando as fontes mentem (3)




O jornalista cuja mensagem reproduzimos no poste anterior - Luís Silvestre - , apesar de não nos ter dado uma resposta satisfatória à questão colocada ao seu director, a saber, quais as fontes em que se baseou para afirmar o contrário do que aconteceu, espraiou-se, em vez disso, por considerações acerca de qual poderia ter sido a verdadeira razão por detrás do Prémio Nobel concedido a Egas Moniz.

Para tal, socorreu-se do teor de uma entrevista ao neurologista Alexandre Castro Caldas, por uma lado e, por outro, da recente biografia de João Lobo Antunes, Egas Moniz, uma biografia*.

Indo ao essencial, chamo a atenção para o facto de ambos os neurologistas conhecerem os resultados de (pelo menos) uma das investigações realizadas nos arquivos da Fundação Nobel que revelou ter o Comité sempre  (1928, 1933, 1937, 1944 e 1949) negado à Angiografia Cerebral a importância requerida para a atribuição do prémio.

Logo, é altamente inadequado citá-los como "fonte" de uma interpretação que continua sem dar resposta à questão inicialmente levantada.

* ANTUNES, João Lobo – Egas Moniz, uma biografia. 1ª ed. Lisboa: Gradiva, 2010, 375 p, ISBN 978-989-616-398-3.

quarta-feira, janeiro 05, 2011

Quando as fontes mentem (2)


Egas Moniz, por Miguel*

Pedimos à Revista Sábado que nos indicasse a(s) fonte(s) em que se baseou para contrariar a evidência histórica de Egas Moniz ter recebido o Prémio Nobel pela Leucotomia e não pela Angiografia, como o texto referido no poste anterior afirma.

A resposta chegou-nos há pouco. Vem assinada pelo jornalista Luís Silvestre e reza assim:


Caro Sr. Manuel Correia,
Obrigado pela sua mensagem. A questão que coloca é pertinente e, como autor do texto, cabe-me esclarecer a sua objecção. Em rigor, o prémio Nobel da medicina e fisiologia foi atribuído a Egas Moniz pelo seu trabalho pioneiro (e agora muito polémico, como também é referido no artigo) relacionado com a leucotomia pré-frontal (por vezes designada genericamente como lobotomia).
No entanto, vários historiadores e investigadores da biografia do médico português referem que o prémio foi o culminar de várias nomeações anteriores (1928, 1933, 1937, 1944 e 1949) principalmente devido ao desenvolvimento de técnicas inovadoras de angiografia. Só a última foi devida ao seu trabalho relativo à leucotomia, precisamente a que lhe deu o Prémio, mas muitos peritos acreditam que foi apenas um pretexto do comité Nobel para premiar o trabalho de uma vida.
Especialistas como o neurologista Alexandre Castro Caldas, que eu entrevistei algumas vezes defendem isso mesmo: “O Nobel não lhe foi dado pela terapêutica, mas pelo avanço do conhecimento”, como referiu ainda recentemente numa entrevista à RTP. Também há indicações nesse sentido na recente biografia de Egas Moniz, do neurologista João Lobo Antunes, editado pela Gradiva, onde se percebe a forte campanha de marketing (com os meios da época e em grande medida instigada pelo próprio Egas Moniz), para que lhe fosse atribuído o Nobel pelo trabalho que desenvolveu ao longo de toda a vida.
Claro que o texto seria mais exacto e correcto se referisse todos estes pormenores. Mas por uma questão de economia de espaço, tal não foi possível. Por esse lapso, as minhas desculpas.
Cordialmente,
Luís Silvestre (jornalista)

Deixo para outro poste um comentário a esta resposta. Para já registo-a aqui para que os eventuais interessados possam entender a relação do texto acerca de Egas Moniz, publicado na revista Sábado, e o modo como a justificação é apresentada no mail do seu autor.

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sexta-feira, novembro 19, 2010

Quando as fontes mentem (1)

[click sobre a imagem para aumentá-la]

Na sua edição de ontem (18/11/2010) a revista SÁBADO, (edição em papel) em suplemento intitulado Os melhores hospitais doença a doença, publica, na página 17, o apontamento histórico que aqui reproduzimos. A intenção é louvável; o resultado é lamentável. O Prémio Nobel atribuído a Egas Moniz não se deveu à Angiografia Cerebral mas sim à Leucotomia Préfrontal. Gostaríamos de saber, apesar de tudo, quais terão sido as fontes utilizadas. Sempre poderíamos aprender mais qualquer coisa…

terça-feira, novembro 16, 2010

Como ganhar um Prémio Nobel: algumas sugestões


A edição online de La Recherche publica "Comment obtenir un prix Nobel", artigo interessante, da autoria de Mathieu Nowak, que fornece algumas sínteses estatísticas e outras particularidades do funcionamento da Fundação Nobel.

Num registo meio irónico, termina alertando para o perigo de contracção da nobelite, um tipo de doença que parece atacar alguns cientistas esperançosos. Depois de fornecer receitas para potenciais candidatos ao Prémio, previne-os contra o risco de contrairem a nobelite.

Francamente!

terça-feira, novembro 02, 2010

A 1ª República, os médicos, a saúde e o corpo




A não perder.

Versão virtual também [aqui].

O Catálogo contém bons artigos de Rita Garnel (Comissária da Exposição), "Corpo: Estado, medicina e sociedade no tempo da I República"; de João Lobo Antunes, sobre Egas Moniz, "Algum ilusório sucesso e muitas contrariedades"; de Maria Fátima Nunes, "As sociabilidades médico-científicas"; de Madalena Esperança Pina, "As faculdades de medicina na I República"; de João Rui Pita, "A farmácia na República"; de Alexandre Alegre, "Saúde, higiene e arquitectura escolar"; de Jorge Fernandes Alves, "Saúde e fraternidade"; de José Morgado Pereira, "A psiquiatria no tempo da I República"; e de Jorge Costa Santos, "Corpo desviante".

terça-feira, outubro 12, 2010

Prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia de 2010



Robert G. Edwards


O Prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia foi descerrado este ano a um dos “pais” da Fertilização in Vitro (IVF no acrónimo anglo-saxónico), Robert Geoffrey Edwards, pelo desenvolvimento do método (e suas aplicações clínicas). Imediatamente após o anúncio, o Professor Christer Höög, do Comité Nobel, deu uma curta entrevista (disponível no Site Oficial da Fundação Nobel) acerca de algumas das questões envolvidas.

Christer Höög salientou o carácter inédito do prémio deste ano. Segundo ele,  é a primeira vez que os residentes do Karolinska premeiam a reprodução medicamente assistida, fazendo-o, neste caso, mais de meio século depois da divulgação pública dos primeiros resultados obtidos em laboratório e 37 anos após o nascimento do primeiro "bebé proveta".

A manipulação de embriões suscitou, desde o início, questões religiosas e éticas. Há quem veja neste prémio "tardio" uma espécie de levantamento do embargo ético à manipulação de embriões humanos, coisa que Christer Höög rejeita na referida entrevista.

Há, porém, um outro aspecto muito interessante no discurso de Höög. Justificando a "demora" no reconhecimento da eficácia da Fertilização In Vitro, o porta-voz do Comité Nobel sublinha que os numerosos estudos de acompanhamento forneceram, ao longo dos últimos trinta anos,  uma base sólida para a fundamentação do veredicto. E nas entrelinhas deste último argumento, não pode deixar-se de detectar um sinal: o de que o Comité Nobel reconhece, implicitamente,  nem sempre ter tido desse cuidado...

segunda-feira, outubro 11, 2010

A Medicina na Azulejaria (*)






Um repositório da azulejaria (**) associado à história das doenças e das saúdes, navegando à vista a história da medicina. A autora (***) põe em relação as mitologias e as origens ocidentais dos saberes curativos, entretecidas de apontamentos breves sobre o modus faciendi de físicos, cirurgiões e barbeiros, através de um roteiro da azulejaria portuguesa que atravessa hospitais, igrejas, conventos e palácios, guiando o olhar do leitor com elementos da história das artes e das ciências da saúde.

Ao longo de 89 gravuras que reproduzem peças da azulejaria que contêm os tais traços que o título promete, a docente e investigadora da Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa, identifica os temas associados à sanidade por sábios, santos, deuses e médicos, discorrendo sobre arte, ciência, religião, ilustrando contextos com ditados, comentários,  fábulas e fechando com uma homenagem fulgurante a Abel Salazar que terá dito um dia que O médico que só sabe de medicina, nem de medicina sabe.

Um livro para todos.




(*) PINA, Madalena Esperança, Traços da Medicina na Azulejaria de Lisboa, Casal de Cambra, Caleidoscópio, 2010.

(**) Tal como reza a sinopse da WOOK, ” A Azulejaria é como se sabe uma arte muito própria de Portugal, que atingiu um destaque na cultura e na identidade do nosso país. Esta obra procura dar a conhecer de uma forma objectiva e realista as representações da azulejaria que se prendem com a temática da Medicina reforçando a sua vertente mais humanista. A autora relacionou ainda este contexto a outras áreas afins como a acção médica e patológica, a higiene e a assistência, os ciclos temáticos sobre os cinco sentidos e os quatro elementos, a iconografia religiosa e outros. A obra debruçou-se nos azulejos produzidos entre o século XVII e a década de 90 do século XX na área de Lisboa.”

(***) Madalena Esperança Pina é docente de História da Medicina na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa desde 2001, onde obteve o grau de Doutor. Licenciou-se em História, variante de História da Arte, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa . É também investigadora do CEHFCI – Centro de Estudos de História e Filosofia da Ciência.