domingo, março 23, 2008

Egas Moniz e o Prémio Nobel (2)



Datado de 10 de Junho de 1954, o manuscrito de Egas Moniz intitulado "Apontamentos [não revistos] a propósito do Prémio Nobel de 1949", regista o diário dos acontecimentos ocorridos cinco anos antes, passando em revista as primeiras notícias, as reacções, as felicitações e... os silêncios.

Pode ler-se, por exemplo, na página 3:


"Os parabéns chegaram dos colegas, dos amigos, dos conhecidos e desconhecidos, do povo do país que vibrou com a minha alegria e com a recompensa ao meu trabalho.

Do governo, dois amigos antigos mandaram-me telegramas em nome pessoal. Da Presidência da República, nada. O Marechal Carmona tão solícito em me saudar em outros momentos da vida, esqueceu-se ou não quis evidenciar-se."

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Do espólio do Psiquiatra Joaquim Seabra Diniz.
Cortesia de Lina Seabra Diniz e Armando Myre Dores.

Outras perspectivas (14)




Para ilustrar o conteúdo do post anterior, a ficha de matrícula do Serviço de Saúde/Repartição de Pessoal da CP, onde foram assinaladas a entrada ao serviço, em Estarreja (1903), em Lisboa (1907), e a reforma (1945). Cortesia do Arquivo Histórico e dos Recursos Humanos da CP.

quinta-feira, janeiro 31, 2008

Outras perspectivas (13)


Egas Moniz foi também um ferroviário, no sentido lato que lhe é dado pelo facto de ter pertencido aos quadros daquela empresa durante praticamente toda a sua vida activa.
Pouco após a conclusão do curso de medicina, em Coimbra, Egas Moniz "entrou para o serviço da CP, primeiro como simples médico de secção (em Estarreja) e depois como especialista de doenças nervosas, no ano de 1903, onde permaneceu até fins de 1944, data em que foi atingido pelo limite de idade." (1)

No ano em que se reformou, o Boletim da CP dedica-lhe uma página de louvor. Em rodapé, um lema: "Uma grande vontade gera um grande valor" em clara alusão aos atributos da figura celebrada.
"O Professor Dr. Egas Moniz, por ter completado 70 anos de idade, deixou de fazer parte do quadro de especialistas do Serviço de Saúde, onde muitos anos figurou como neurologista." (2)

E finalmente, um destaque de página inteira, com foto centrada na metade inferior da página, comunicando que "A Assembleia Nacional, a Faculdade de Medecina e a Ordem dos Médicos prestaram merecidíssima homenagem ao ilustre sábio, a quem foi entregue por um banco da capital, a avultada importância de Esc. 432.023$50, correspondente à parte que lhe cabia no Prémio Nobel". (3).

Eis, pois, uma outra comunidade empresarial que reivindica Egas Moniz como um dos seus.


(Documentos digitalizados à direita. Click para aumentar)

(1) "Vultos célebres dos nossos caminhos de ferro" in Rede Geral, nº 11, Setembro de 1977, pág. 8.





(2) "Doutor António Egas Moniz" in Boletim da CP nº 186, Dezembro de 1944, pág. 225





(3) "O 'Prémio Nobel de Medecina' foi conferido ao antigo médico da C.P. Prof. Dr. Egas Moniz" in Boletim da CP nº 247, Janeiro de 1950, pág.3




quarta-feira, janeiro 23, 2008

Outras Perspectivas (12)





Egas Moniz foi também "médico ferroviário". Na antiga carruagem "posto médico" patente no Museu dos Caminhos de Ferro de Lousado, instalado nas antigas oficinas do Caminho de Ferro, em Guimarães, Moniz é homenageado. Curiosamente, a a locomotiva n.º 6 CFPPV (na foto) com a qual se reconstitui uma composição da época, foi construída em Inglaterra em 1874. Quer dizer: tomou "nascimento" no mesmo ano em que o homenageado nasceu.
Coincidências.

quarta-feira, dezembro 26, 2007

Outras Perspectivas (11)

No programa da SIC-Mulher, Serralves fora de horas (6ªs feiras), (21/12/2007) Nuno Monteiro Pereira, convidado (urologista e andrologista) "revela" que nas Faculdades de Medicina das Universidades Portuguesas não há ainda uma cadeira de sexologia.
Antes, Mariana Pinto da Costa, Coordenadora Nacional do Departamento de Saúde Reprodutiva e Sida da Associação Nacional de Estudantes de Medicina (ANEM), declarara à LUSA, em Setembro passado, que «O sexo é um tema que não é muito falado no decorrer do curso de medicina».

Reparem: Egas Moniz fez publicar a 1ª edição de A Vida Sexual, (ver p. ex. aqui), no início do século XX. Se os cursos de medicina não acolheram, entretanto, a sexologia como área interdisciplinar necessária e pertinente, isso quer dizer que os processos destinados à preparação para os temas associados à sexualidade têm estado pouco mais que ... parados.

Se quiséssemos identificar os processos bloqueados no século XX, teríamos necessariamente de incluir este. Um século depois, estamos praticamente na mesma.

terça-feira, outubro 30, 2007

Empreendedorismo (1)


A par de muitas outras actividades, Egas Moniz participou em diversas iniciativas empresariais. Apesar de tal não ter sido destacado, nem pelo próprio, nem pelos autores das numerosas notas biográficas a seu respeito, Moniz ficou associado à fundação da Companhia de Seguros A Nacional (Porto, 1906), e à constituição da Sociedade de Produtos Lácteos, Lda. ( 1923).


"Em 1905, a Sociedade Henri Nestlé foi nomeada fornecedora da Casa Real Portuguesa de farinha láctea, leite condensado e chocolate. Até 1920, a indústria de lacticínios portuguesa limitava-se a um número escasso de fabricantes artesanais de manteiga que não respeitavam os mais elementares requisitos de higiene. A Sociedade de Produtos Lácteos (SPL), criada em 1923 por três figuras de primeiro plano, viria a constituir o embrião da Nestlé Portugal.

A fundação desta sociedade foi resultado de três aspirações que se completavam. Uma delas era a de um médico que, embora não fosse especialista em nutrição de crianças, recusava-se a baixar os braços perante os elevados índices de mortalidade infantil, resultantes em parte da inexistência de um alimento que substituísse eficazmente o leite materno. Esse médico era o professor Egas Moniz, cujas descobertas no campo da Neurologia lhe granjearam renome internacional e o Nobel da Medicina em 1949."(1)



(1)Isabel Oliveira, "80 anos de papas" na Única (Expresso) nº 1619 de 8/11/2003

segunda-feira, outubro 29, 2007

Outras Perspectivas (10)



Na página 11 do nº 419 da revista FOCUS (24 a 30/10/2007). Ponto forte: não deixar cair a memória do primeiro Nobel português; ponto fraco: o afunilamento da efeméride para o leucótomo e para a imprecisão da asserção "solucionando algumas psicoses".
A fotografia é do "jovem doutor". Em 1949, Moniz ia nos seus 75 anos...
Ao jornalismo de efemérides não poderá provavelmente fazer-se as mesmas exigências de rigor e profundidade que se fazem ao ofício dos historiadores. Ainda assim, aqui fica o comentário.