quinta-feira, dezembro 15, 2005

No cinquentenário da morte de Egas Moniz (3)


No cinquentenário do Prémio Nobel

Egas Moniz dedicou mais de duas décadas da sua existência à política activa. Deputado (monárquico, dissidente monárquico, constituinte republicano e, depois, sidonista); fundador do Partido Centrista Republicano, dirigente do Partido Nacional Republicano, tendo tentado, ainda pelo menos mais uma vez, a criação de um novo partido político, após ter sido demitido do Governo de José Relvas; Diplomata: Ministro Plenipotenciário de Portugal em Madrid; Ministro dos Negócios Estrangeiros; Presidente da Delegação Portuguesa à Conferência de Paz de Versailles.

Bem vêem, sem uma referência devidamente desenvolvida a esta dimensão com que ocupou mais de 20 anos - ¼ da sua existência ou um terço da sua vida adulta - torna-se difícil fazer-lhe a justiça de o tomar na sua inteireza e compreender melhor as competências que transferiu, depois, para o saber estratégico com que assegurou alguns dos maiores sucessos que obteve.



quarta-feira, dezembro 14, 2005

No cinquentenário da morte de Egas Moniz (2)



Egas Moniz e a Psicanálise (em livro)

Em aditamento ao poste anterior, e a propósito dos modos de recordar Egas Moniz, - o homem, a obra e os contextos respectivos, - anote-se a consideração que os nossos primeiros psicanalistas têm por Egas Moniz, reservando-lhe o lugar histórico da primazia na introdução da psicanálise em Portugal. Com «As bases da psicanálise» - texto publicado em 1915 em A Medicina Contemporânea nº 33, páginas 377 – 383, depois incluído em «A vida sexual», a partir da edição de 1922 - Egas Moniz dá à estampa, em Portugal, a primeira abordagem sistemática sobre os conceitos fundamentais do método analítico elaborado por Sigmund Freud..

Pedro Luzes, um dos fundadores da Sociedade Portuguesa de Psicanálise, escreve, a este respeito:

Em Portugal, o primeiro trabalho científico sobre psicanálise é de Egas Moniz que, em 1915, dá à lição inaugural do Curso de Neurologia o título de As Bases da Psicanálise. Esta lição era seguida por mais três, sobre o mesmo tema que não apareceram a público.

[Pedro Luzes, Cem anos de psicanálise, Lisboa, ISPA, 2002, pág. 10]


No cinquentenário da morte de Egas Moniz (1)



PÚBLICO de 13/12/2005 (pág. 28)

Marcando o cinquentenário da morte de Egas Moniz (1874-1955), Clara Barata assinou, no PÚBLICO de 13/12/2005 (link reservado a assinantes) três peças (páginas 28 e 29), cujos títulos apontam para os aspectos tratados em cada uma delas.

A herança do único cientista português galardoado com o Nobel ainda é polémica

O prémio podia ter chegado logo na década de 20, pela angiografia

Walter Freeman foi o grande apóstolo da lobotomia nos Estados Unidos

Clara Barata dá-nos um excelente trabalho jornalístico, cruzando depoimentos, de acordo com um critério abarcando uma pluralidade de perspectivas e, ao mesmo tempo, informativo e equilibrado.

Pena que, tantos anos depois, não se tenha sequer aludido, a par das realizações do cientista, outros aspectos da sua intervenção multifacetada: o da carreira política activa (1901 – 1922), e o de introdutor da Psicanálise em Portugal (1915 – 1925). Um e outro, são da máxima importância para tentar compreender o homem, a época e os sentidos que foi revestindo.




quinta-feira, dezembro 01, 2005

Bibliografia sobre Egas Moniz (6)


Egas Moniz raramente foi a público discutir acerca dos seus trabalhos científicos. Apesar das numerosas críticas que lhe foram dirigidas, quer relativamente aos efeitos colaterais das soluções opacificantes que usou na Angiografia Cerebral, quer quanto às apreciações negativas que impendiam sobre a leucotomia préfrontal, Egas Moniz optou, quase sempre, pelo silêncio.

O texto cuja capa ficou afixada acima, corresponde a um desses raros momentos em que Moniz se ocupou publicamente das avaliações negativas do seu método.

Começa assim:

«Quando pensei em alterar o circuito de influxos no encadeamento das células nervosas cerebrais, no propósito de modificar a vida psíquica dos alienados, meditei cerca de três anos sobre a ousada tentativa. Apenas Almeida Lima, colaborador constante dos nossos trabalhos de investigação, soube dos meus ainda mal esboçados propósitos e da base anatómica em que os firmava.» (*)

Moniz tem então 80 anos de idade e este trecho do exórdio tem uma importância fundamental. Corresponde a uma contestação indirecta das versões em que era acusado de ter agido precipitadamente, no final de 1935, no regresso de Londres, onde participara no 2º Congresso Internacional de Neurologia. Teria assistido aí à apresentação de resultados da ablação bilateral do córtex préfrontal de duas chimpanzés (Becky e Lucy). Charles Jacobsen - que trabalhara em colaboração com John Fulton - fizera a demonstração que, após a lobectomia, a reacção furiosa que se verificava anteriormente, sempre que as chimpanzés procuravam comida e não a encontravam, desaparecia e dava lugar a um comportamento calmo, destituído de picos emocionais. Moniz nunca confirmou a versão segundo a qual teria, então, formulado a questão de saber

se a remoção dos lobos frontais evita o desenvolvimento de uma neurose experimental em animais e elimina a frustração comportamental, porque não seria, então, possível, aliviar os estados de ansiedade nos humanos por meios cirúrgicos?


Ora, a datação que Egas Moniz revela nesta comunicação, remete para 1931 (cerca de 4 anos antes) o início dos seus estudos e reflexões conducentes à prática da leucotomia pré-frontal, revelando que, com Almeida Lima, já então tratava secretamente dos preparativos.



(*)
Egas Moniz, A leucotomia está em causa, Academia das Ciências de Lisboa, Biblioteca de Altos Estudos, 1954. Cortesia de Armando Myre Dores e Lina Seabra Dinis, a cuja biblioteca privada pertence o exemplar supra.


terça-feira, novembro 29, 2005

Egas Moniz não era pseudónimo (3)



Egas Moniz é também patrono de Loja Maçónica (Maçonaria Regular)

Portanto, Egas Moniz não era pseudónimo. Por razões que o próprio Moniz descreveu, a coisa decorreu de uma mitificação feita pelo seu tio padrinho, Abade de Pardilhó, convicto de uma linhagem que mergulharia nos confins da fundação da nacionalidade. Contudo, quando Egas Moniz foi iniciado na Maçonaria (Loja Simpatia e União, em 15 de Dezembro de 1910, de acordo com os arquivos do Grande Oriente Lusitano), escolheu para nome simbólico precisamente o «mesmo». Porquê «mesmo» entre aspas? Porque assim, ao escolher para nome simbólico (equivalente a um pseudónimo, grosso modo), o nome de «Egas Moniz», a questão colocada por João Alves dos Santos retoma pertinência. Com o nome simbólico que os mações iniciados escolhiam, prestavam muitas vezes, simultaneamente, uma homenagem a uma figura histórica de sua eleição. Ao escolher o «próprio» nome, Egas Moniz estava a homenagear o aio de D. Afonso Henriques, do qual o seu tio Abade acreditava descender, ou a homenagear-se a si próprio? Não sabemos mas, por precaução, somos levados a reformular a resposta imediata que demos no primeiro poste desta série, à pergunta «Foi ‘Egas Moniz’ pseudónimo do insigne neurologista português ganhador do primeiro Nobel?». A devida resposta, tendo em consideração o que recordámos até aqui, é não. À partida não era pseudónimo. Mas, depois, até chegou a ser. Aí está um caso «concreto» em que uma coisa pode ser e não ser, ao longo do tempo.

Egas Moniz não era pseudónimo (2)



António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz

Segundo outro estudioso desta matéria «As suas origens não tão remotas e muito mais verosímeis mergulham até ao século XVI e ao fundador da Casa do Mato, em Avanca., Valentim Pires Valente, a quem D. João III concedeu carta de brasão de armas em 1548. Dessa Casa, arruinada em meados de novecentos, procederam todas as outras - Marinheiro, Outeiro, Areia... - e, nas sucessivas gerações de parentela, D. Ana Rosa Tavares de Resende, casada com André Norton e bisavó do General José Mendes Ribeiro Norton de Matos, republicano, mação, ilustrado colonialista e figura de proa da oposição ao Estado Novo de Oliveira Salazar.» (*)


(*)
Malheiro da Silva, Armando B., (2000), «Egas Moniz e a Política. Notas avulsas para uma biografia indiscreta» in Pereira, A. L. E Pita, J.R., (Coord.), Egas Moniz em Livre Exame, Coimbra, Minerva. (p. 239)

Egas Moniz não era pseudónimo (1)



Emissão de 14/12/1989, INCM, Nota de 10.000$00. Retrato de Egas Moniz sobre a direita

Provoca estranheza a muitos a coincidência do nome porque ficou conhecido o primeiro português a conseguir um prémio Nobel. Egas Moniz foi também o nome do célebre aio de Dom Afonso Henriques, que nós imaginamos sempre pessoa de bem, capaz de honrar a palavra dada até às últimas consequências. João Alves dos Santos, depois de avaliar os textos disponíveis neste blogue, escreveu-me

Viva.Vi o seu blog Egas Moniz. Parabens :)Não consigo encontrar informação que justifique o "porquê" de o Dr. Egas Moniz ter recorrido ao uso de um pseudónimo "Egas Moniz"Se conhece este motivo, agradeceria a sua explicação.Muito obrigado

João Alves dos Santos


Enviei-lhe de imediato um trecho da autoria do visado acerca dessa questão, enfatizando que

O próprio Egas Moniz, em livro de carácter autobiográfico intitulado «ANossa Casa» (pp. 15-16), explica:

«A família do lado de meu pai tinha prosápias de fidalguia pelos Resendes,Sás, Abreus, Freires, Valentes, Almeidas, Pinhos... eu sei lá! um nuncaacabar de ascendências ilustres a que as pessoas de idade se referem comdevoção (...).Ora, como os Resendes, segundo autoridades na matéria, provêm de Egas Moniz,aio de Dom Afonso Henriques, que, pela sua numerosa prole, deixoudescendestes para repartir por todas as velhas casas do Norte, resolveu meupadrinho, Rev. Caetano de Pina Rezende Abreu Sá Freire, substituir oRezende pelo apelido mais pomposo do ascendente Egas Moniz»

Mas, é claro, a história nunca acaba onde pusémos o «último» ponto final.