sexta-feira, janeiro 01, 2021

 

Egas Moniz ao Panteão Nacional (3)


E eis que com a revolução do 25 de abril de 1974 tudo parece ter mudado. Quer dizer: o Panteão Nacional continua a amparar o sono eterno das figuras que o Estado Novo lá instalou - uma espécie de hino monumental ao nacionalismo expansionista sob o pálio daqueles seis (Camões, Cabral, Gama, Henrique, Albuquerque e Nun'Álvares) - mas, desde o derrubamento do regime fascista à mercê de novos gestos do poder político democrático.

São então concedidas honras de Panteão a Humberto Delgado (1906-1965) interrompendo, em parte, o sentido com que o Panteão Nacional fora aconchegado em 1966. Um dos homens que enfrentou o regime de Salazar em eleições presidenciais, assassinado pela polícia política do regime deposto (PIDE/DGS), impunha-se na concessão de honras em 1990.

Estavam feitas as contas do século XX.

Poderia ter ocorrido a alguém que Egas Moniz (1874-1955) primeiro prémio Nobel português da Fisiologia ou Medicina seria uma hipótese forte para a concessão dessas honras? Poderia... mas não aconteceu.

Sabemos que esta tradição de, por um lado, engrandecer e mitificar as biografias dos antepassados, omitindo, por outro lado, todas as vozes discordantes é de um simplismo atroz. A memória dos que foram vencidos e humilhados deve ser também do conhecimento das gerações vindouras. A nossa tradição do culto dos valores pátrios requer revisão crítica e muita atenção às armadilhas impostas pelo pensamento único e pelo chauvinismo.

Mas o Panteão Nacional continuava ali. Humberto Delgado entrou, e muito bem. Moniz ainda não.





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